27 de janeiro de 2012

Sociedade de Massa

   Antes de ingressar no serviço público, acreditava que minhas vontades, demandas e necessidades individualizavam-me.
   Fazia sentido supor que, ao querer algo, eu estava manifestando minha liberdade individual, expressando aquilo que constituia minha identidade singular.
   Até que chegou meu primeiro dia de trabalho no judiciário. Um sujeito chamado Francisco, meu primeiro chefe, pediu que eu separasse quatrocentos e tantos processos pelo valor da causa, empilhasse-os em ordem crescente e colocasse fitas durex coloridas em cada capa, para identificá-los.
   Não guardo mágoas de Francisco. Na época eu não tinha um computador, nem um carimbo. Servidor novo que era, tinha apenas uma mesa. O que mais eu poderia fazer?
   Importante é que os quatrocentos processos pediam a mesma coisa: quatrocentas pessoas diferentes, através de advogados diferentes, solicitando a mesma coisa... variavam os valores, apenas.
   Descobri que a Justiça não cuida de necessidades individuais, mas de carências massificadas. Não à toa, existe uma tabela de classes e assuntos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que, de antemão, elenca o que uma pessoa comum pode querer judicialmente.
   As demandas são previamente estabelecidas e padronizadas.
   Pedir não é manifestação da individualidade, é a evidência de um padrão.