22 de junho de 2014

Para não dizer que não falei da Copa

   If you talk to a man in a language he understands, that goes to his head. If you talk to him in his language, that goes to his heart.

   Numa tradução livre, a frase fica assim:

   Se você fala com um homem numa língua que ele entende, a mensagem vai para a cabeça. Se lhe fala na língua dele, a mensagem vai ao seu coração.

   Recente pesquisa divulgada no New York Times confirmou a afirmação acima, de Nelson Mandela.
   No estudo, psicólogos apresentaram um dilema moral aos participantes. A situação hipotética consistia em sacrificar uma vida para salvar cinco.
   Quando o dilema era apresentado num idioma que o participante conhecia, mas que não era sua língua natal, ele tendia a fazer a escolha matematicamente mais racional. Sacrificar um para salvar cinco.
   No entanto, quando o problema era apresentado no idioma do participante, este acabava por fazer uma escolha mais emocional e salvava aquela uma vida.

   A burocracia judiciária fala uma língua que não é nativa a ninguém. Nem ao juiz, nem ao autor, nem ao réu, nem aos advogados, nem aos burocratas.
   Ao falar esse idioma que não nos é familiar, tendemos, todos nós, operadores do direito, tal qual os participantes da pesquisa, a fazer escolhas utilitárias, matematicamente racionais.
   Eventualmente, e são acontecimentos muito esporádicos, deparo-me com decisões judiciais escritas em português, simples e direto, sem jargões técnicos e nem por isso menos elaboradas.
   Nesses raros momentos, tenho a impressão de que quem fala não é a fria máquina burocrática, mas a Justiça, essa entidade que nos é tão familiar. 
   E ao falar assim, uma fala simples, de alguém que nos conhece, fico com a certeza de que aquela mensagem pode chegar ao coração dos indivíduos que buscam o poder judiciário.

   Suponho que tão importante quanto fazer com que as pessoas entendam a Justiça, é fazer com que elas a sintam.

   Amanhã é dia de jogo da Copa do Mundo. Sentiremos o futebol em nossas almas, como talvez, um dia, venhamos a sentir a Justiça... se ela, ao menos, falar a nossa língua.


Link para o artigo do NYT: http://www.nytimes.com/2014/06/22/opinion/sunday/moral-judgments-depend-on-what-language-we-are-speaking.html?hp&rref=opinion&_r=0