Nunca fui à
Catedral de Notre Dame, mas já a imaginei, como uma metáfora. O texto abaixo, faz parte
do livro “A Igreja de Pedra”, escrito em 2001
“Imaginem o
interior de uma ampla catedral de pedra nos limites do qual parece
encerrar-se toda a existência – não creio, particularmente, que
alguém seja capaz de compor tal figura, no entanto, considero um
exercício válido para a imaginação. Nesta imagem, mantenham a
tênue iluminação natural que mal preenche o interior do cômodo,
mas retirem todas as janelas, os vitrais e portas que haviam
anteriormente sido representados. Excluam também, sem pudores, todos
os móveis e artefatos sacros que possam estar dispostos neste
interior imaginário.
A imagem que lhes
resta é a de um amplo átrio sem entradas ou saídas, absolutamente
vazio, mas onde se pode enxergar, por uma luz que vem de lugar
nenhum, todo o âmago pétreo e frio que não comporta adornos de
qualquer espécie. No entanto, sabemos, é ainda o interior de uma
catedral de pedra.
Para compormos a
totalidade desta tortuosa metáfora, resta-nos ainda imaginar, neste
nosso estranho ambiente, um bem dimensionado besouro, não maior que
quatro centímetros, cujo bater de asas ecoa em toda a catedral. O
diminuto inseto, cuja aparência assemelha-se a um fragmento de ônix
polido, curiosamente, em seu voo, nos faz perceber as características
que constituem a erma estrutura de pedra que antes nos eram
desconhecidas.
O silêncio e a
ausência que são necessários para notarmos um inseto – para
notarmos a nós mesmos – são quase insuportáveis”.