18 de abril de 2012

Cem Anos de Solidão

   Conta-nos Gabriel Garcia Marquez que a cidade imaginária de Macondo, certa vez, sofreu com uma estranha epidemia. Seus habitantes, gradualmente começaram a esquecer os nomes das coisas; depois, olvidaram não apenas as palavras que os nomeavam, mas o próprio uso dos objetos. Para não se perderem nesse esquecimento, criaram anotações e marcas que indicassem a função de cada peça esquecida e as penduravam nos objetos.  Entretanto, aos poucos, esqueceram para quê serviam os símbolos e o quê significavam as inúmeras notas agarradas nos utensílios; então criavam outras identificações como referência às significações perdidas...
   Até hoje, esta é uma das passagens que mais me encantam na literatura. Até há muito pouco tempo atrás, acreditava que a epidemia criada por Marquez era uma grande metáfora sobre como os homens se perdem na desenfreada busca pela construção de um sentido para o mundo que os rodeia.
   Continuo achando encantadora a passagem do livro, mas descobri que a doença relatada pelo escritor colombiano não é uma mera fantasia literária, mas uma verdadeira patologia.
   Logo que entrei no serviço público fui subordinado de um servidor chamado Paredes. Ele marcava de inúmeras formas as capas do processo para indicar, visualmente, o que havia sido feito, o que faltava fazer, de onde o processo vinha, para onde deveria ir, o grau de urgência, a qual juiz pertencia, quando prescrevia, etc. Quem olhasse o armário de processos sob a guarda de Paredes, olharia para uma grande parede de autos adesivados com símbolos e significados inapreensíveis. Achei estranho o Método Paredes, mas supus que era aquele o seu jeito de trabalhar e que se tratava apensa de uma particularidade daquele servidor.
   Entretanto, hoje trabalho num cartório numa cidade distante 400km de onde trabalha Paredes e, apesar da lonjura, tenho um colega que também fantasia os processos com lembretes, fitas coloridas, carimbos, etiquetas, etc, indicando o que deve ser feito com cada um dos autos sob sua guarda. Cícero, também age com a preocupação dos habitantes de Macondo.
   A doença existe, os sintomas estão aí e, assim como em Macondo, ela alastra-se lentamente pelo judiciário. Há uma Macondo burocrática e enferma que nos recusamos a enxergar.
   Talvez, essa seja uma das razões pelas quais comecei a escrever este blog, para tentar loucamente não me esquecer para que servem as coisas que amo: quais seus nomes, de onde vêm, para onde me podem levar, qual se sentido... estou, também, enfermo!

P.S.: Esta semana tenho provas na faculdade... talvez as postagens rareiem, ou talvez a doença progrida!