7 de abril de 2012

Curso Alternativo de Direito Processual

   Jesus foi crucificado, morreu na cruz, foi sepultado, ressuscitou no terceiro dia e, depois, subiu ao céu. Confesso não ser muito religioso, entretanto, pelo simples fato de viver no mundo ocidental, ao menos esse resumo da parte final dos evangelhos eu conheço de cor.
    Não à toa.
   Todos os anos, nessa época, o Ocidente reconta essa história. No Brasil, País preponderantemente cristão, representamo-la em encenações teatrais e em filmes que são reprisados nas madrugadas da TV aberta.
  E o que significa essa representação toda, essa repetição incansável de um acontecimento cronologicamente tão distante? E, mais importante, o que tem isso a ver com a burocracia do judiciário, tema desse blog?
   Ainda que não interesse a ninguém, ontem li um artigo sobre uma palavra grega: "mímesis". Este artigo analisava que, na sua versão para as línguas ocidentais modernas, essa palavra grega foi traduzida como "representação".
   Qual o problema? O problema é a tradução, como sempre. O autor aponta que o termo "representação", no ocidente, supõe um afastamento do objeto representado. Assim, um pintor que pinta um vaso, "representa" esse objeto, mas não faz o vaso propriamente dito, o vaso verdadeiro. Do mesmo modo, a representação teatral de um evento passado (como a paixão de cristo), não é o evento mesmo, mas uma cópia daquilo que aconteceu.
   Investigando a origem e o uso da referida palavra, ao autor do artigo conclui que a expressão "mímesis", em grego, nada tinha a ver com representação. Para os gregos, loucos que eram, "mímesis" era a capacidade de reviver o evento. Uma encenação não era a cópia de um evento, mas o evento mesmo, como se a situação encenada fosse a própria realidade acontecendo de novo. 
   Por essa nova interpretação do conceito, um ator que representasse Cristo, não seria uma alusão ao personagem bíblico, mas o próprio Cristo, sendo julgado, condenado, crucificado, sepultado e renascendo. 
   O que ocorre todos as anos nessa época e nesse país cristão é "mímesis", ou é representação? Eu não sei e, para falar a verdade, não me interessa.
  Agora, deixando de lado o aspecto religioso da discussão, se olharmos para a burocracia, mais especificamente, se olharmos para o processo judicial, veremos que ele, na verdade, é um rito. Como todo rito, ele tem um roteiro... e na medida em que segue esse roteiro ele é, na verdade, a encenação desse roteiro.
   Uma discussão judicial, por essa ótica, é uma teatralização do roteiro escrito no Código Processual. E aqui me interessa saber se essa encenação é "mímesis" ou representação.
   Cada ação judicial que ingressa no sistema judiciário, independente de seu resultado, é a efetivação do Direito Processual, é a realização, em ato, do roteiro escrito no Código Processual. O processo se realiza em cada ação. Toda vez que uma contenda se põe diante do judiciário, há uma realização do ordenamento jurídico vigente - o roteiro acontece - e, mais importante, há a efetivação material da preponderância do Estado sobre o indivíduo. O Estado se transubstancia em Lei e a Lei se faz cumprir.  
   Ao menos, é isso o que pregam os manuais de Direito Processual.
   A burocracia, portanto, é "mímesis".
   Com o final do feriado se aproximando, aguardo ansioso meu retorno aos palcos da burocracia.