23 de abril de 2012

Efeito Pavlov

   Algumas das pessoas que lêem este blog me perguntaram se a burocracia é verdadeiramente tão rotineira e entorpecente.
   Não sei se é tanto quanto aparenta, nem sei se é tão pouco quanto se duvida. Mas conto-lhes uma história para tentar esclarecer a contenda.
   Num dos primeiros setores onde trabalhei, a sala era dividida por um comprido balcão cinza-claro. O tampo do móvel tinha três palmos de largura e estendia-se de uma parede à outra, criando a divisão do espaço. Numa das pontas, entretanto, o tampo era rebatível e criava uma passagem para a outra parte da sala.
   Quem entrasse no setor, só conseguiria passar para o outro lado do balcão por esse estreito vão do tampo rebatido. Por ele passavam, e ainda passam, os servidores, os estagiários, os seguranças, a mulher do cafezinho, etc.
   O que me deixou curioso nessa decoração burocrática é que, desde que fui lotado naquela repartição, o tampo sempre se manteve aberto, provavelmente por uma questão de comodidade, rotina e hábito.
   Certo dia decidi fechar o danado do tampo, para ver como as pessoas reagiriam. Os servidores, ao chegarem para trabalhar, indagaram por que a administração havia reformado o móvel. Os estagiários, acostumados a visitar o setor para entregar os mais diversos documentos, ao notarem o tampo fechado, indagaram como poderiam dar a volta para desovarem os ofícios e petições. Quando a mulher do cafezinho, indignada, ameaçou retornar com o líquido divino pelo mesmo caminho por onde viera, fui obrigado a abrir o tampo.
   Nada havia de novo. Bastava rebater o tampo e o Universo voltaria à sua ordem natural.
   Enfim, não sei se a burocracia é tão rotineira e entorpecente quanto aparenta, nem sei se é tão pouco quanto se duvida.