19 de fevereiro de 2014

Os Balcões do Judiciário

   Há alguns anos, nas aulas introdutórias de direito processual, lembro-me de ter ficado impressionado com a franqueza da doutrina processualista. "O fim último do processo não é a Justiça, mas a pacificação social".
   Sentia que essa proposição operava como um bisturi, estirpando, de forma inequívoca, a Justiça do âmbito do processo.
   Desde a distribuição da demanda, até a sentença, o processo segue seu curso, alheio à deusa Têmis.
   O bisturi processual, assim, criaria uma paz alheia ao conceito de Justiça.
   Que paz é essa?
   Trabalhando num cartório judicial, atendendo aos cidadãos que vinham até o balcão em busca de seus direitos, em busca de Justiça, notei que o judiciário é estruturado de tal forma que o indivíduo jamais chega ao balcão perguntando: "Como está o meu direito?", ou "Como está sendo feita a Justiça no meu caso".
    Não, ele é obrigado a perguntar sempre: "Como está o meu processo?".
    Ao ser obrigado a colocar a pergunta nesses termos, o indivíduo perde justamente aquilo que viera buscar, a Justiça. Neste momento o bisturi corta fundo e de maneira precisa. O cartorário responde descrevendo exatamente a situação processual da demanda, sem considerar o que é justo ou injusto: "Este processo está aguardando a manifestação do Ministério Público", "O processo está aguardando a perícia judicial", "O processo está concluso para decisão", etc.
   O cidadão, do outro lado do balcão, com um olhar esvaziado, vai embora sem ver satisfeito aquilo que viera saber (a Justiça), mas com uma resposta precisa e completa à pergunta que formulou: "Como está o meu processo?".
   O cidadão sai resignado e aí, acredito, reside a pacificação social almejada pelo Direito Processual, na resignação do sujeito.

   Fato é que não há black blocks nos balcões da Justiça.

   A paz esteja convosco.